Receber o salário em dia é mais do que um direito; é a garantia da dignidade de todo trabalhador. Afinal, o salário é a base para o sustento da família, o pagamento de contas e a realização de projetos. No entanto, a realidade de muitos brasileiros, infelizmente, é o atraso salarial. Se você está passando por essa situação, saiba que não está sozinho e, mais importante, tem direitos garantidos por lei para combater essa irregularidade.
Atraso de salário é uma situação que gera angústia e incerteza, mas o direito do trabalho no Brasil oferece mecanismos para proteger o empregado. Vamos detalhar quais são os seus direitos e o passo a passo para buscar o que lhe é devido na Justiça.
O Que a Lei Diz Sobre o Atraso de Salário?
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é clara: o pagamento do salário deve ocorrer até o quinto dia útil do mês subsequente ao trabalhado. Por exemplo, o salário referente a junho deve ser pago até o quinto dia útil de julho. Se esse prazo não for cumprido, a empresa já está em mora, ou seja, em atraso.
É crucial entender que o salário não é apenas o valor bruto acordado. Ele engloba também as horas extras, adicionais (noturno, insalubridade, periculosidade), comissões e outras parcelas remuneratórias. O atraso em qualquer uma dessas verbas configura atraso salarial.
Consequências para o Empregador em Caso de Atraso Salarial
O empregador que atrasa o salário do seu funcionário está sujeito a diversas penalidades, que vão além do simples pagamento do valor devido.
- Multa pelo Atraso: A Justiça do Trabalho entende que o atraso salarial gera uma multa a ser paga ao empregado. Geralmente, essa multa corresponde a 10% do valor do salário devido, acrescida de 5% por dia de atraso, após o quinto dia útil, até o limite de um salário mensal. É importante notar que essa multa pode variar conforme o que for estabelecido em acordos ou convenções coletivas de trabalho da categoria.
- Correção Monetária e Juros: O valor do salário atrasado não fica “congelado”. Ele é corrigido monetariamente desde a data em que deveria ter sido pago, para que o poder de compra não seja corroído pela inflação. Além disso, são aplicados juros de mora (1% ao mês) sobre o valor corrigido, a partir da data de vencimento da obrigação.
- Indenização por Danos Morais: Em casos de atrasos reiterados e prolongados, que comprovadamente causem sérios transtornos ao trabalhador, como impossibilidade de pagar contas essenciais, restrição de crédito ou abalo psicológico, o empregado pode ter direito a uma indenização por danos morais. Essa indenização visa compensar o sofrimento e os prejuízos extrapatrimoniais decorrentes da conduta abusiva do empregador.
- Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho: Este é um direito muito importante e pouco conhecido por muitos. Se o atraso salarial for reiterado e grave, caracterizando descumprimento das obrigações contratuais por parte do empregador, o trabalhador pode pleitear a rescisão indireta do contrato de trabalho. Isso significa que a rescisão do contrato ocorre por “culpa” da empresa, e o empregado terá direito a todas as verbas rescisórias como se tivesse sido demitido sem justa causa (aviso prévio, férias proporcionais + 1/3, 13º salário proporcional, saque do FGTS + multa de 40%, seguro-desemprego).
O Que Fazer Diante do Salário Atrasado?
Se o seu salário atrasou, é fundamental agir de forma estratégica para resguardar seus direitos.
- Documente Tudo: Mantenha um registro detalhado dos atrasos. Anote as datas de vencimento e as datas em que o pagamento realmente ocorreu (se ocorreu). Guarde holerites, extratos bancários, recibos ou qualquer outro documento que comprove os atrasos. Se as comunicações forem por e-mail ou aplicativos de mensagem, salve-as. Essa documentação será crucial em uma eventual ação judicial.
- Tente a Negociação Amigável: Antes de partir para medidas mais drásticas, converse com seu empregador. Explique a situação e tente entender o motivo do atraso. Muitas vezes, um diálogo inicial pode resolver o problema. No entanto, se promessas não forem cumpridas ou se houver reincidência, a negociação amigável pode não ser suficiente.
- Formalize a Cobrança: Se a conversa não resolver, formalize a cobrança por escrito. Uma notificação extrajudicial (pode ser uma carta com aviso de recebimento ou um e-mail com confirmação de leitura) pode demonstrar ao empregador que você está ciente dos seus direitos e disposto a buscá-los. Isso pode, muitas vezes, acelerar o pagamento.
- Busque Ajuda Sindical: Verifique se o seu sindicato pode intervir na situação. Muitos sindicatos oferecem suporte jurídico aos seus filiados e podem mediar a negociação com a empresa ou orientar sobre os próximos passos.
- Procure um Advogado Especialista: Este é o passo mais importante se as tentativas anteriores não derem resultado. Um advogado trabalhista é o profissional habilitado para analisar sua situação, verificar a documentação e orientar sobre a melhor estratégia legal. Ele poderá calcular os valores devidos, incluindo multas, correção e juros, e ingressar com a ação judicial cabível.
Como Cobrar o Salário Atrasado na Justiça?
A cobrança judicial de salário atrasado é feita por meio de uma Reclamação Trabalhista na Justiça do Trabalho.
- Ação de Cobrança: O advogado entrará com uma ação judicial pleiteando o pagamento dos salários atrasados, suas correções, juros e as multas cabíveis.
- Pedido de Rescisão Indireta: Se a situação de atraso for grave e persistente, o advogado pode requerer a rescisão indireta do contrato de trabalho, conforme explicado anteriormente. Isso permite que o trabalhador saia da empresa e receba todas as suas verbas rescisórias, além de buscar um novo emprego, sem perder os direitos da demissão sem justa causa.
- Audiências e Provas: No processo judicial, haverá audiências onde as partes tentarão um acordo. Se não houver acordo, o processo seguirá para a fase de instrução, onde serão apresentadas as provas (documentos, testemunhas) que demonstrem os atrasos salariais e os prejuízos causados.
- Sentença e Execução: Após a análise das provas, o juiz proferirá uma sentença. Se a sentença for favorável ao trabalhador, a empresa será condenada a pagar os valores devidos. Caso não pague voluntariamente, inicia-se a fase de execução, onde medidas como penhora de bens ou bloqueio de contas podem ser aplicadas para garantir o cumprimento da decisão judicial.
Considerações Finais e a Importância da Ação Rápida
É fundamental que o trabalhador não demore para buscar seus direitos. Existem prazos para ingressar com ações trabalhistas (prescrição), e o tempo pode atuar contra você. Além disso, quanto antes a questão for resolvida, menores serão os prejuízos e o estresse.
A situação de salário atrasado é desgastante, mas lembre-se: a lei está do seu lado. Não hesite em buscar o apoio de um advogado especialista em direito do trabalho para garantir que seus direitos sejam plenamente respeitados e que você receba tudo o que lhe é devido. A valorização do trabalho é um pilar da nossa sociedade, e lutar por seus direitos é lutar pela sua dignidade.