A convivência em condomínios é um exercício diário de tolerância e respeito mútuo. No entanto, essa harmonia é frequentemente quebrada por um tipo de morador que exige uma intervenção legal mais rigorosa: o vizinho antissocial.
Este morador, seja ele proprietário ou inquilino, transforma a rotina do condomínio em um pesadelo, causando perturbação constante, ameaças, agressões verbais ou danos às áreas comuns. A síndica ou o síndico, diante de um problema que transcende a simples multa por barulho, se pergunta: quais medidas legais o condomínio pode tomar para restabelecer a ordem e, em casos extremos, expulsar o morador antissocial?
A legislação brasileira, notadamente o Código Civil, prevê mecanismos robustos para proteger a coletividade do condomínio. Neste artigo, detalharemos o passo a passo legal que o corpo diretivo deve seguir para agir de forma eficaz e juridicamente segura contra condutas que ameacem o sossego e a segurança dos demais, uma realidade que exige atenção especial nas grandes cidades, como São Paulo.
O Conceito de Comportamento Antissocial no Condomínio
O morador antissocial é aquele cuja conduta coloca em risco ou compromete gravemente a saúde, a segurança e o sossego dos demais condôminos, conforme previsto no Artigo 1.337 do Código Civil.
É crucial diferenciar o mero mau comportamento (como barulho excessivo pontual ou uso indevido do elevador) do comportamento antissocial.
| Mau Comportamento (Multa Comum) | Comportamento Antissocial (Ações Legais Graves) |
| Excesso de ruído em um final de semana. | Barulho constante, dia e noite, após reiteradas advertências. |
| Estacionar em vaga errada ocasionalmente. | Ameaçar funcionários, agredir vizinhos ou danificar o patrimônio comum (quebra-quebra). |
| Jogar lixo fora do horário. | Atos de vandalismo, uso de áreas comuns para atividades ilícitas. |
A ação legal mais drástica — a expulsão ou multa coercitiva — só se aplica ao comportamento antissocial, que é persistente e intolerável.
O Passo a Passo Legal do Condomínio: A Escada da Punição
A lei exige que o condomínio atue de forma gradativa e documentada. A ação direta (judicial) só deve ocorrer após esgotar as medidas internas.
1. Advertência e Multas Convencionais (Conforme Regimento Interno)
O síndico deve iniciar o processo aplicando advertências formais e as multas previstas no Regimento Interno e Convenção por infrações de menor potencial (por exemplo, 1/10 do valor da cota condominial).
2. A Multa por Conduta Antissocial (Art. 1.337, Caput, CC)
Se o comportamento persistir após as multas convencionais e causar prejuízo aos demais, o condomínio deve aplicar a multa coercitiva por conduta antissocial.
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Valor: A multa é de até dez vezes o valor da cota condominial (a taxa mensal), independentemente das multas de menor valor já aplicadas.
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Procedimento: Essa multa deve ser aprovada por quórum qualificado (normalmente 3/4 dos condôminos restantes em assembleia, conforme a convenção).
3. A Multa por Conduta Reiterada e Incompatível (Art. 1.337, Parágrafo Único)
Para casos de extrema gravidade e reiteração, o Código Civil permite uma punição ainda maior. Se o morador for reiteradamente antissocial e gerar incompatibilidade de convivência, o condomínio pode aplicar uma multa correspondente a cinco vezes o valor da cota condominial mensal, repetível a cada mês em que a conduta persistir.
A Ação Judicial Extrema: Expulsão do Condômino Antissocial
É aqui que a situação se torna mais complexa e exige a intervenção de um advogado especialista em Direito Condominial, algo vital em cidades de alta densidade populacional, como São Paulo.
O Código Civil não prevê expressamente a “expulsão”, mas a jurisprudência (decisões reiteradas dos tribunais) já sedimentou o entendimento de que, em casos gravíssimos, o condomínio pode ingressar com uma Ação Judicial de Obrigação de Não Fazer cumulada com Pedido de Desocupação Compulsória.
Requisitos para o Pedido de Expulsão:
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Prova da Reiteração: É indispensável apresentar o histórico de todas as advertências e multas aplicadas, demonstrando a persistência do comportamento.
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Prova da Gravidade: É preciso provar que a conduta é intolerável (ameaças de morte, agressões físicas, uso ilícito do imóvel, etc.).
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Quórum de Aprovação: Embora a lei não exija formalmente, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) costuma exigir que o pedido de expulsão seja aprovado em assembleia por quórum qualificado (geralmente 2/3 dos condôminos presentes ou de todos os condôminos, dependendo da gravidade e da convenção).
Analogia: O Judiciário entende que o direito individual de propriedade cede espaço ao direito fundamental à paz, saúde e segurança da coletividade. Ninguém pode usar sua propriedade para gerar danos contínuos aos vizinhos.
Pontos de Atenção e Riscos para o Síndico
A atuação contra o vizinho antissocial deve ser técnica, para evitar que o condomínio, o síndico ou os vizinhos sejam processados por assédio moral ou dano.
⚠️ A Importância da Prova
O grande desafio é a prova. O condomínio precisa de:
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Livro de Ocorrências: Detalhes de datas, horários e testemunhas.
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Vídeos e Gravações: Mídias que comprovem a agressão ou o vandalismo.
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Boletins de Ocorrência (B.O.): Se houver agressão ou ameaça, o condômino agredido deve registrar o B.O.
⚠️ Inquilino vs. Proprietário
A multa e a ação judicial são direcionadas ao morador. Contudo, o condomínio deve notificar o proprietário do imóvel sobre todas as infrações. O proprietário é solidariamente responsável pelas dívidas (multas) e tem o dever de agir para que seu inquilino respeite as regras.
A não intervenção do proprietário pode levá-lo a ser corresponsável judicialmente, algo que aumenta a pressão para a desocupação do imóvel.
Mini-FAQ: Perguntas Frequentes Sobre o Tema
1. O inquilino pode ser multado?
Sim. A multa é aplicada à unidade (imóvel). O proprietário é o devedor principal perante o condomínio, mas pode cobrar do inquilino (e até despejá-lo) com base nas multas aplicadas.
2. O síndico pode tomar a decisão de aplicar a multa sozinho?
A multa convencional (comum) pode ser aplicada pelo síndico, conforme a convenção. Mas a multa antissocial (10x a cota) e a decisão de ingressar com a ação de expulsão devem, obrigatoriamente, ser aprovadas em assembleia por quórum qualificado.
3. Qual o prazo para o morador antissocial ser expulso após a decisão judicial?
Não há um prazo fixo. O Judiciário concederá um prazo razoável, geralmente de 30 a 90 dias, para a desocupação voluntária. Caso contrário, será cumprido um mandado de despejo coercitivo.
4. A multa antissocial pode ser cobrada judicialmente?
Sim. A multa por comportamento antissocial, uma vez aprovada em assembleia e não paga, é um título executivo extrajudicial e pode ser cobrada na Justiça como qualquer outra dívida condominial.
Conclusão
Lidar com o vizinho antissocial é um dos maiores desafios da administração condominial e exige que o síndico e o corpo diretivo ajam não apenas com firmeza, mas com extremo rigor técnico-jurídico. A falha no procedimento (como a falta de aprovação em assembleia) pode anular a penalidade mais grave ou reverter a tentativa de expulsão.
A paz e o bem-estar da coletividade são direitos protegidos pelo Código Civil. Não se deve permitir que o comportamento desregrado de um morador comprometa a qualidade de vida de dezenas de famílias.
O primeiro passo é garantir a legalidade e a documentação perfeita de todas as infrações.
Se seu condomínio em São Paulo ou região está enfrentando um caso de morador antissocial e necessita de um plano de ação seguro e juridicamente embasado, entre em contato. Nossa experiência em Direito Condominial oferece a tranquilidade de saber que todas as medidas estão sendo tomadas dentro da lei para resolver o problema de forma definitiva.
