O falecimento de um familiar, além do natural desgaste emocional, traz consigo uma série de obrigações burocráticas e legais. A principal delas é a abertura do inventário, o procedimento jurídico destinado a apurar e formalizar a transmissão dos bens, direitos e dívidas do falecido aos seus herdeiros. Este processo, no entanto, é conhecido por ser demorado, dispendioso e, muitas vezes, desproporcional ao valor dos bens deixados.
Nesse contexto, surge uma dúvida frequente e de grande relevância prática: em que situações é possível evitar o inventário e utilizar um procedimento mais ágil e econômico? A resposta reside na figura do Alvará Judicial.
O alvará judicial é uma ordem ou autorização emitida por um juiz, que permite aos herdeiros praticar um ato específico, como sacar um valor em dinheiro, transferir um bem ou movimentar uma conta, sem a necessidade de percorrer todas as etapas formais de um inventário completo.
Entender os limites e os requisitos legais do alvará é crucial. Quando aplicado corretamente, ele representa uma economia significativa de tempo e recursos para os herdeiros, especialmente nos casos de heranças de pequeno valor. Neste artigo, detalharemos a natureza do alvará judicial e as condições exatas em que ele se torna um substituto válido do inventário, com base na legislação brasileira.
A Natureza do Alvará Judicial e a Lei 6.858/80
O Alvará Judicial não é um procedimento de partilha de bens. Sua finalidade é desburocratizar o acesso a valores residuais e específicos que, por sua natureza e montante, não justificam a complexidade de um inventário tradicional (judicial ou extrajudicial).
O fundamento legal para este procedimento simplificado está na Lei nº 6.858/80 e nos artigos correlatos do Código de Processo Civil (CPC), que visam oferecer uma solução rápida para os herdeiros de bens de menor expressão.
A principal aplicação do alvará, que o eleva ao status de substituto do inventário, é quando o falecido não deixou outros bens sujeitos a inventário, restando apenas os valores previstos na lei.
Requisitos Legais para o Alvará Judicial em Substituição ao Inventário
Para que seja possível utilizar o alvará judicial simplificado e, assim, evitar a abertura do inventário, os herdeiros devem preencher, cumulativamente, uma série de requisitos estritos.
1. Tipos de Valores Abrangidos
O alvará se aplica a valores específicos, geralmente de caráter social e trabalhista:
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Valores de FGTS e PIS/PASEP: Saldo de contas individuais de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e de PIS/PASEP não sacados em vida.
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Restituições Fiscais: Valores devidos ao falecido pela Receita Federal, como restituição de Imposto de Renda.
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Saldo de Contas Bancárias: Saldo em contas de poupança ou contas correntes, desde que o limite de valor seja respeitado.
2. O Limite de Valor (Referência Legal)
Este é o requisito nevrálgico e mais discutido na prática. A Lei nº 6.858/80 estabelece que o alvará pode ser utilizado para saldos bancários e outros valores desde que não ultrapassem 500 (quinhentas) Obrigações do Tesouro Nacional (OTN).
Apesar de a OTN não existir mais, os tribunais brasileiros geralmente utilizam este limite como referência para determinar se o valor é pequeno o suficiente para justificar o alvará. O valor exato (em reais) é periodicamente atualizado e interpretado por cada Tribunal de Justiça Estadual. Portanto, a consulta a um advogado especialista é imprescindível para garantir que o saldo total se enquadra no limite vigente de sua jurisdição.
3. Inexistência de Outros Bens (O Fator Decisivo)
Para que o alvará substitua o inventário por completo, o falecido não pode ter deixado outros bens a serem partilhados, como imóveis, veículos, aplicações financeiras de alto valor ou empresas.
Contudo, se houver outros bens que estão sendo inventariados (por exemplo, um imóvel), é possível solicitar um alvará acessório para liberar apenas os valores de PIS/FGTS, agilizando o saque desses montantes enquanto o inventário principal tramita. Neste caso, ele não substitui o inventário, mas sim o complementa para liberar fundos específicos.
4. Consenso e Herdeiros Capazes
A via do alvará, por ser simplificada, exige o consenso entre todos os herdeiros.
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Se todos os herdeiros forem maiores e capazes, o procedimento é mais rápido.
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Se houver herdeiros menores ou incapazes, o procedimento ainda é possível, mas a participação do Ministério Público se torna obrigatória. O órgão atuará como fiscal da lei para garantir que os interesses dos menores e incapazes sejam devidamente resguardados, especialmente em relação à cota-parte que lhes cabe.
Alvará Judicial vs. Inventário: Uma Análise de Eficiência
A principal vantagem do alvará reside na eficiência.
| Característica | Alvará Judicial | Inventário (Judicial ou Extrajudicial) |
| Tempo de Resolução | Semanas a poucos meses (depende da Vara). | Meses a anos (devido à complexidade e burocracia). |
| Imposto (ITCMD) | Não incide sobre FGTS/PIS; isenção para pequenos valores. | Incidência obrigatória sobre o valor total da herança. |
| Custas Processuais | Custas mínimas ou isentas. | Custas processuais elevadas (calculadas sobre o valor total do patrimônio). |
| Complexidade | Petição simples, sem avaliação e partilha detalhada. | Exige avaliação de bens, recolhimento de impostos, nomeação de inventariante. |
Portanto, se o seu caso se encaixa nos requisitos da Lei 6.858/80, a escolha pelo alvará judicial representa a diferença entre resolver a situação em dois ou três meses versus aguardar o desfecho de um processo que pode se arrastar por um longo período.
O Procedimento Passo a Passo: A Importância da Petição
Para dar entrada no alvará judicial simplificado, os herdeiros devem seguir alguns passos práticos, sempre com o acompanhamento de um advogado:
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Reunir Documentação: Certidão de óbito do falecido, documentos pessoais (RG, CPF) dos herdeiros, comprovante do vínculo (casamento ou união estável), e o documento que comprove o saldo ou valor a ser sacado (extrato do FGTS, saldo bancário, etc.).
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Petição pelo Advogado: O advogado elabora a petição inicial, comprovando de forma clara que os requisitos da Lei 6.858/80 foram integralmente preenchidos.
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Decisão Judicial: O juiz, após ouvir o Ministério Público (se for o caso), e verificar a inexistência de outros bens e o consenso, autoriza a expedição do alvará.
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Expedição do Documento: O alvará é o documento que os herdeiros apresentarão diretamente ao banco, à Caixa Econômica Federal (para FGTS/PIS) ou ao órgão pagador, para efetuar o saque ou transferência do valor.
Outrossim, a precisão na petição é vital. Um erro na documentação ou na comprovação do limite de valor pode levar o juiz a indeferir o pedido e, consequentemente, obrigar a abertura do inventário tradicional.
🏛️ A Economia de Tempo e Recursos
O Alvará Judicial é um poderoso instrumento de simplificação, criado para evitar que a máquina judicial seja sobrecarregada por heranças de pequeno valor. Ele oferece uma rota ágil e de baixo custo, que cumpre o papel de inventário naquelas situações específicas onde a burocracia do processo tradicional seria desproporcional.
Muitos herdeiros, desconhecendo a Lei 6.858/80, acabam desnecessariamente submetendo-se a um inventário completo e oneroso para sacar apenas o FGTS ou valores residuais em conta.
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