O fim de um relacionamento conjugal encerra o vínculo afetivo entre o casal, mas jamais extingue a responsabilidade parental. O dever de sustento, guarda e educação dos filhos permanece intacto, conforme ditames da Constituição Federal e do Código Civil. Contudo, na prática, a materialização desses deveres após a separação gera inúmeros conflitos. Talvez o mais recorrente e financeiramente sensível seja: quem deve pagar a escola particular?
Esta não é uma despesa trivial. A educação privada representa, muitas vezes, a maior fatia do custo mensal de uma criança. Quando os pais não residem mais sob o mesmo teto, definir como essa conta será dividida torna-se um dos principais pontos de litígio nos processos de divórcio e dissolução de união estável.
A resposta não é tão simples quanto “50% para cada um”. A Justiça brasileira analisa essa questão sob uma ótica muito mais complexa, que envolve o padrão de vida da criança e a capacidade financeira individual de cada genitor. Este artigo visa esclarecer, de forma técnica e prática, como o Direito de Família trata a responsabilidade dos pais separados pela educação e quais são os caminhos para uma solução justa.
Desenvolvimento: Decifrando as Obrigações Financeiras na Educação
Para entender quem paga a conta, precisamos primeiro desmontar alguns mitos e estabelecer os conceitos jurídicos que regem o sustento dos filhos no Brasil.
1. O Fundamento: Poder Familiar e o Binômio Necessidade-Possibilidade
Antes de falar em dinheiro, falamos em Poder Familiar (antigamente chamado de “pátrio poder”). Segundo o Artigo 1.634 do Código Civil, o poder familiar compete a ambos os pais, independentemente da situação conjugal. Isso significa que a decisão sobre qual escola o filho frequentará (pública ou particular, e qual particular) deve ser mútua.
Definida a necessidade da educação, entra em cena o pilar da pensão alimentícia: o Binômio Necessidade-Possibilidade (Art. 1.694, §1º, CC).
- Necessidade: Refere-se ao que o filho precisa para viver de forma digna, mantendo, sempre que possível, o padrão de vida que desfrutava antes da separação. A escola particular, se já era uma realidade, entra aqui.
- Possibilidade: Refere-se à capacidade financeira de ambos os genitores de arcar com essas necessidades.
Portanto, a responsabilidade pelo sustento é sempre de ambos, mas a proporção do pagamento será definida pela capacidade de cada um.
2. A Mensalidade Escolar está Inclusa na Pensão Alimentícia?
Este é o ponto central da confusão. A resposta é: depende de como a pensão foi estabelecida (seja por acordo homologado ou por sentença judicial).
A mensalidade escolar é uma despesa ordinária, fixa e previsível. Ela não é um “extra” eventual; ela acontece todo mês. Sendo assim, ela deve estar contemplada no cálculo geral do sustento da criança.
Existem duas formas principais de estruturar esse pagamento:
- Pensão Fixada em Valor (Pecúnia): O juiz (ou o acordo) determina que o genitor não-residente (aquele que não mora com a criança) pagará um valor fixo mensal (ex: 30% do seu salário ou 3 salários mínimos) ao genitor residente. Neste cenário, presume-se que a escola particular será paga deste montante, somado à contribuição do genitor que mora com a criança. Este modelo é arriscado, pois se a escola sofrer um reajuste alto, o valor da pensão pode ficar defasado, gerando novo litígio.
- Pagamento “In Natura” (Recomendado): Este é o modelo mais moderno e seguro. A pensão é dividida: o genitor A paga um valor X em dinheiro (para alimentação, moradia, etc.) e se responsabiliza diretamente pelo pagamento da escola (ou de 50%, 70% dela, conforme sua possibilidade). O genitor B, por sua vez, pode arcar com o plano de saúde diretamente, por exemplo, além de contribuir com sua parte nos custos diários.
O pagamento in natura (direto na fonte, no boleto da escola) é preferível porque garante que o dinheiro será efetivamente usado para a educação, reduzindo o atrito sobre a gestão financeira.
3. Despesas Ordinárias vs. Extraordinárias: O Caso do Material e Matrícula
Se a mensalidade é uma despesa ordinária, o que fazer com os custos anuais, como matrícula, material escolar e uniforme?
Aqui, a jurisprudência (o entendimento dos tribunais) tende a classificar essas despesas como extraordinárias, mas previsíveis. Elas não ocorrem todo mês, mas se sabe que ocorrerão todo ano.
Em um bom acordo de divórcio, essas despesas são tratadas à parte da pensão mensal. O mais comum e justo é que elas sejam rateadas na proporção de 50% para cada genitor, salvo se houver uma disparidade financeira muito grande entre os pais (onde se pode aplicar a proporcionalidade, ex: 70/30).
Se o acordo for omisso (um erro grave), o genitor que pagou o material escolar sozinho terá que cobrar o outro judicialmente (execução ou ação de cobrança), provando a necessidade e a razoabilidade do gasto.
4. O Mito da Guarda Compartilhada e a Divisão 50/50
É fundamental desfazer um equívoco comum: guarda compartilhada não significa divisão igualitária (50/50) das despesas.
A guarda compartilhada, que é a regra no Brasil, diz respeito à divisão da responsabilidade pelas decisões da vida do filho (Art. 1.583, CC) e, idealmente, a um equilíbrio no tempo de convivência.
A obrigação financeira (pensão e custos) segue uma lógica diferente: ela é baseada na proporcionalidade da renda de cada um (o binômio possibilidade-necessidade). Se um genitor ganha R$ 10.000 e o outro ganha R$ 2.000, é absolutamente injusto (e ilegal) determinar que ambos paguem R$ 700 de escola. O genitor com maior capacidade arcará com um percentual maior daquela despesa, mesmo que a guarda seja compartilhada.
5. O Princípio do Padrão de Vida e a Decisão Unilateral
Dois cenários são muito comuns em disputas sobre a escola particular:
- O filho sempre estudou em escola particular: Neste caso, aplica-se o Princípio da Manutenção do Padrão de Vida e o Melhor Interesse da Criança. O divórcio dos pais não pode, salvo real impossibilidade financeira, rebaixar o padrão educacional do filho. Ambos serão obrigados a contribuir para manter a criança na escola (ou em uma similar), sempre respeitando suas possibilidades.
- Um genitor quer matricular o filho (que estudava em escola pública) em uma particular: Aqui voltamos ao Poder Familiar. O genitor A não pode matricular o filho em uma escola cara e enviar o boleto para o genitor B. A decisão deve ser consensual. Se não houver consenso, e o genitor que deseja a mudança não puder arcar com o custo sozinho, ele deverá ingressar com uma Ação Revisional de Alimentos, provando ao juiz que a criança necessita daquela mudança e que o outro genitor tem possibilidade de pagar, sem prejudicar o próprio sustento.
A Importância de um Acordo Detalhado
Como vimos, a resposta para “quem paga a escola particular” é: ambos os pais, na exata proporção de suas capacidades financeiras, pois o dever de educação é solidário e irrenunciável.
O maior erro que os casais cometem ao se divorciar é redigir um acordo de pensão genérico. Frases como “O pai pagará 30% do salário mínimo a título de pensão” são um convite a litígios futuros sobre escola, plano de saúde, material escolar e todas as outras despesas.
Um processo de divórcio ou definição de alimentos bem conduzido exige uma assessoria jurídica especializada, que saiba antever esses conflitos. A melhor solução é um acordo de alimentos detalhado, que especifique, cláusula por cláusula, como as despesas ordinárias (mensalidade, plano de saúde) e as extraordinárias (material, uniforme, medicamentos) serão divididas, seja por percentual (50/50) ou por pagamento in natura.
Se você está passando por um divórcio ou busca revisar a pensão alimentícia para incluir custos educacionais, a clareza é sua maior aliada. Nosso escritório é especializado em Direito de Família e está habituado a estruturar acordos que protegem o interesse dos filhos e trazem segurança financeira e paz de espírito aos pais.
Convidamos você a entrar em contato conosco. Agende uma consulta para esclarecer suas dúvidas, receber uma orientação personalizada sobre a divisão de despesas ou solicitar um orçamento para sua ação.
