Uma advogada em um escritório acolhedor mostra documentos para uma mãe, explicando os direitos à continuidade da pensão alimentícia para seu filho adulto com deficiência.

Uma das certezas mais difundidas no universo do Direito de Família é que a obrigação de pagar pensão alimentícia, em regra, se encerra quando o filho atinge a maioridade civil, aos 18 anos. Essa premissa, embora correta na maioria dos casos, abre espaço para uma dúvida crucial e angustiante para muitas famílias: e quando o filho, mesmo adulto, possui alguma deficiência que o impede de prover o próprio sustento?

A chegada da maioridade, que para muitos representa um marco de independência, para pais e mães de filhos com deficiência pode significar o início de um período de grande incerteza jurídica e financeira. O temor de que o suporte financeiro indispensável para cobrir terapias, medicamentos e cuidados especiais seja subitamente cortado é uma realidade.

Contudo, é fundamental esclarecer: o direito à pensão alimentícia não se extingue automaticamente aos 18 anos para filhos com deficiência. A lei e a justiça brasileira protegem a continuidade desse amparo, mas o fundamento jurídico se transforma. Este artigo completo irá explicar por que esse direito permanece, o que a lei diz, como comprovar a necessidade e o que fazer para garantir a manutenção desse suporte vital.

O Fim da Menoridade e a Mudança no Fundamento Jurídico da Pensão

Enquanto o filho é menor de idade, a obrigação de pagar a pensão alimentícia decorre do poder familiar. Trata-se de um dever inerente aos pais de garantir o sustento, a saúde e a educação da sua prole. A necessidade do menor, nesse caso, é presumida por lei.

Quando o filho completa 18 anos, o poder familiar cessa. É por isso que, em situações normais, o alimentante (quem paga a pensão) pode solicitar a exoneração da obrigação. Entretanto, para o filho com deficiência que o incapacita para o trabalho, a base legal da pensão muda. Ela deixa de ser o poder familiar e passa a ser fundamentada no dever de solidariedade familiar e na relação de parentesco, conforme estabelece o Artigo 1.694 do Código Civil.

Em outras palavras, a obrigação persiste não mais por uma presunção de necessidade, mas pela comprovação da necessidade contínua do filho, que, em razão de sua condição, não consegue prover a própria subsistência.

A Incapacidade para o Trabalho como Fator Decisivo

É crucial entender que o direito à continuidade da pensão não está atrelado apenas à existência de um laudo que ateste uma deficiência. O fator determinante para a justiça é a consequência dessa deficiência: a incapacidade, total ou parcial, para exercer uma atividade laboral e, consequentemente, para se manter financeiramente.

Essa incapacidade pode derivar das mais diversas condições, sejam elas de natureza física, mental, intelectual ou sensorial. Condições como Transtorno do Espectro Autista (TEA) em graus mais severos, paralisia cerebral, síndromes genéticas incapacitantes, entre outras, são frequentemente a base para a manutenção do benefício.

Portanto, o ponto central do processo será demonstrar, de forma clara e robusta, o nexo causal entre a condição de saúde do filho e sua impossibilidade de inserção no mercado de trabalho de forma a garantir seu sustento.

Como Comprovar a Necessidade? O Famoso Binômio Necessidade-Possibilidade

Mesmo após a maioridade, a fixação do valor da pensão continua sendo guiada pelo famoso binômio necessidade-possibilidade. Ou seja, é preciso comprovar tanto as necessidades de quem recebe quanto as possibilidades financeiras de quem paga.

  • Comprovação da Necessidade do Filho: Esta é a etapa mais crítica. Não basta apenas alegar. É preciso documentar minuciosamente todos os gastos mensais do filho adulto, que podem incluir:
    • Laudos e relatórios médicos detalhados e atualizados, que atestem a condição e, idealmente, a incapacidade laboral;
    • Custos com tratamentos contínuos, como fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, psicoterapia, etc.;
    • Despesas com medicamentos de uso contínuo;
    • Gastos com educação especial ou cursos adaptados;
    • Custos de cuidadores, se necessário;
    • Despesas básicas de moradia, alimentação, vestuário e transporte adaptado.
  • Análise da Possibilidade do Alimentante: Da mesma forma, a capacidade financeira do pai ou da mãe que paga a pensão será reavaliada. Ele ou ela também poderá apresentar provas de sua renda e despesas para que o juiz fixe um valor justo e equilibrado para a pensão.

O Processo de Exoneração: O Que Fazer Quando o Pai/Mãe Pede o Fim da Pensão?

Um erro comum é acreditar que a pensão cessa automaticamente quando o filho faz 18 anos. Isso não acontece. Para deixar de pagar, o alimentante precisa obrigatoriamente ingressar com uma Ação de Exoneração de Alimentos.

Ao receber a notificação desse processo, o guardião do filho com deficiência (geralmente a mãe) deve, com o auxílio de um advogado, apresentar uma defesa (contestação) robusta, munida de todas as provas documentais mencionadas acima. Será nesse processo que o juiz avaliará se a condição de necessidade do filho persiste, justificando a manutenção da pensão. Ignorar essa intimação é extremamente arriscado, pois pode levar à perda do direito por revelia.

A Questão da Curatela: É Sempre Necessária?

A curatela é um processo judicial que visa nomear um curador para representar um adulto que não possui capacidade de gerir os próprios atos da vida civil. Em muitos casos de filhos com deficiência intelectual ou mental, a interdição e nomeação de um curador (geralmente a mãe ou o pai guardião) se faz necessária.

Embora a curatela formalize a representação legal do filho e seja recomendável, a sua ausência não impede, por si só, a continuidade do recebimento da pensão. A prova da necessidade é o fator primordial. Contudo, ter a curatela regularizada pode facilitar os trâmites processuais e a gestão dos recursos recebidos em nome do filho.

Protegendo Quem Mais Precisa

A maioridade civil não apaga as necessidades especiais e contínuas de um filho com deficiência. A legislação e o sistema judiciário brasileiro, pautados no princípio da dignidade humana e da solidariedade familiar, oferecem o amparo necessário para garantir que o suporte financeiro essencial à sua sobrevivência e bem-estar não seja interrompido.

O caminho para assegurar esse direito, no entanto, exige preparação, organização e, acima de tudo, uma orientação jurídica especializada. Seja para se defender de uma ação de exoneração ou para pleitear a fixação de alimentos para um filho que nunca recebeu pensão, a atuação de um advogado especialista em Direito de Família é crucial.

Esse profissional saberá como reunir as provas corretas, apresentar os argumentos legais pertinentes e lutar para que o direito do seu filho seja integralmente respeitado, garantindo a ele um futuro com mais segurança e dignidade.

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