Advogado especialista apontando uma cláusula em uma escritura de imóvel para um cliente, explicando sobre a cobrança de diferença de valor pela construtora.

Imagine a cena: após anos de espera e pagamento rigoroso das parcelas de seu imóvel na planta, o momento mais aguardado chega — a assinatura da escritura definitiva. A alegria, no entanto, é subitamente interrompida por uma cobrança inesperada: a construtora exige um pagamento adicional, alegando uma diferença de valor na escritura.

Essa situação, infelizmente comum no mercado imobiliário, gera enorme frustração e insegurança nos compradores. Afinal, essa cobrança é legal? De onde surgiu essa dívida não prevista no contrato?

Se você está enfrentando este problema, saiba que essa prática é, na maioria das vezes, abusiva e ilegal. O preço do imóvel é aquele que foi acordado e assinado em contrato, e surpresas financeiras na reta final da negociação ferem diretamente o Código de Defesa do Consumidor.

Neste artigo, vamos explicar por que essa cobrança acontece, o que a lei diz sobre o assunto e, o mais importante, como você deve agir para proteger seus direitos e seu patrimônio.

 

Entendendo os Valores: Por Que Existe Diferença Entre o Contrato e a Escritura?

Para compreender a raiz do problema, é fundamental diferenciar os dois principais valores envolvidos na transação:

  • Valor do Contrato: Este é o preço que você negociou e concordou em pagar pelo imóvel. Ele está formalizado na Promessa de Compra e Venda e foi corrigido ao longo do tempo, geralmente pelo INCC (Índice Nacional de Custo da Construção). Este é, em tese, o valor final e quitado do bem.
  • Valor da Escritura (ou Valor Venal): A escritura pública é o documento que oficializa a transferência de propriedade. Nela, deve constar o valor real da transação. No entanto, para fins de cálculo de impostos, como o ITBI (Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis), a prefeitura utiliza o “valor venal de referência”, que é uma estimativa do preço do imóvel feita pelo poder público. Frequentemente, este valor é superior ao que foi pago originalmente, devido à valorização imobiliária.

O conflito surge quando a construtora utiliza a justificativa do valor venal ser maior para tentar repassar ao comprador uma suposta “diferença” que não tem relação com o preço acordado.

 

A Cobrança é Legal? O Que Diz a Lei e a Justiça

A resposta curta é: não, essa cobrança geralmente é ilegal.

O princípio que rege as relações contratuais é o pacta sunt servanda, que significa “os pactos devem ser cumpridos”. Em outras palavras, o que foi acordado e assinado no contrato de compra e venda tem força de lei entre as partes.

O preço total do imóvel e as condições de pagamento devem estar expressos de forma clara no documento. Qualquer tentativa de impor uma nova obrigação financeira ao consumidor no ato da escritura, sem previsão contratual explícita e transparente, caracteriza-se como uma prática abusiva, conforme o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

A Justiça brasileira tem um entendimento consolidado sobre o tema, considerando essa cobrança uma vantagem manifestamente excessiva por parte da construtora. O valor total a ser pago pelo comprador é aquele definido no contrato, ponto final. As obrigações fiscais e tributárias da construtora não podem, de forma arbitrária, ser repassadas ao consumidor.

 

As Principais Justificativas Usadas Pelas Construtoras (e Por Que Estão Erradas)

Para dar um ar de legalidade à cobrança, as empresas costumam usar alguns argumentos. Os mais comuns são:

  1. “Diferença de ITBI”: Alegam que, como o imposto foi calculado sobre um valor venal maior, o comprador deve arcar com essa “diferença”. Isso é incorreto. A responsabilidade pelo pagamento do ITBI é do comprador, mas ele deve ser calculado sobre o valor real da transação (o valor pago) ou sobre o valor venal, o que for maior. A construtora não pode cobrar um valor extra para si mesma a esse título.
  2. “Atualização Monetária Residual”: Afirmam que a correção pelo INCC não foi suficiente para cobrir todos os custos e a valorização, tentando cobrar um saldo residual. Isso é ilegal. Se o contrato previa a correção por um índice específico e o comprador quitou todas as parcelas, não há que se falar em saldo remanescente não previsto.

Ambas as justificativas mascaram o real objetivo: aumentar o lucro da construtora às custas do consumidor desinformado.

 

Como Agir ao Ser Cobrado por Essa Diferença de Valor?

Ao se deparar com essa exigência, a calma e a informação são suas maiores aliadas. Siga estes passos:

  1. Não Pague a Diferença: Não ceda à pressão. Pagar o valor exigido pode ser interpretado como uma concordância com a cobrança, dificultando um futuro ressarcimento.
  2. Questione Formalmente: Solicite à construtora, por escrito (e-mail ou notificação), um detalhamento completo e a base contratual ou legal para a cobrança. Guarde uma cópia de toda a comunicação.
  3. Não Assine a Escritura com Valor Divergente: Recuse-se a assinar uma escritura que declare um valor que não corresponde ao que você efetivamente pagou, a menos que seja uma exigência do cartório para se adequar ao valor venal. O problema não é o valor na escritura, mas sim a cobrança extra que a construtora faz com base nisso.
  4. Procure um Advogado Especialista: Este é o passo mais importante. Um advogado especialista em direito imobiliário analisará seu contrato, identificará a abusividade da cobrança e tomará as medidas cabíveis, seja por meio de uma notificação extrajudicial para resolver a questão amigavelmente, seja por meio de uma ação judicial para obrigar a construtora a outorgar a escritura pelo preço correto.

Em muitos casos, a construtora pode se recusar a entregar as chaves ou a assinar a escritura enquanto o valor não for pago. Essa coação é ilegal e pode ser combatida na Justiça, inclusive com pedidos de liminar para garantir a posse do seu imóvel.

 

Proteja Seu Direito e Seu Investimento

A aquisição de um imóvel é um marco na vida de qualquer pessoa, e esse momento não deve ser manchado por práticas comerciais desleais. A cobrança de uma diferença de valor na escritura é uma armadilha que visa explorar a vulnerabilidade do comprador na fase final da transação.

A lei está do seu lado. O contrato que você assinou é a principal ferramenta para garantir seus direitos. Não permita que a pressão da construtora o faça arcar com um custo que não é seu. Agir de forma informada e com o suporte jurídico adequado é o caminho para assegurar a propriedade do seu imóvel pelo preço justo e combinado.

Sabemos que este pode ser um momento de grande estresse e incerteza. Por isso, uma orientação profissional faz toda a diferença para que você tome as decisões corretas com tranquilidade e segurança.

Nossa equipe de advogados especialistas está pronta para analisar seu caso e defender seus interesses. Se você está enfrentando essa cobrança indevida, entre em contato conosco. Esclareça suas dúvidas, receba uma orientação personalizada e solicite um orçamento para garantir que seu sonho não tenha um custo final inesperado.

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