Um pai e uma mãe brigando no tribunal

Muitos pais acreditam erroneamente que a falta de um imóvel próprio é um impeditivo intransponível para obter a guarda. Essa crença, contudo, é um mito que precisa ser desfeito. A verdade é que o melhor interesse da criança e do adolescente é o princípio norteador das decisões judiciais sobre guarda. Ter casa própria é um fator, sim, mas está longe de ser o único – ou o mais importante – a ser considerado. Se você é pai e está enfrentando essa situação, este artigo é para você. Vamos detalhar como a Justiça analisa esses casos e o que realmente importa na decisão sobre a guarda.

 

O Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente

No Brasil, o Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) são claros: todas as decisões relativas à guarda e convivência familiar devem priorizar o bem-estar físico, psicológico, emocional e social do filho. Isso significa que o juiz não vai se ater a questões meramente patrimoniais, como a propriedade de um imóvel, se outros fatores essenciais para o desenvolvimento da criança estiverem garantidos.

A moradia é, inegavelmente, um aspecto importante da vida. No entanto, o que a lei busca é a estabilidade do lar, a capacidade de oferecer um ambiente seguro, saudável e acolhedor, independentemente de o imóvel ser alugado, cedido ou próprio. Muitos lares alugados oferecem todas as condições para um desenvolvimento pleno, enquanto uma casa própria, por si só, não garante isso.

 

O Que a Justiça Realmente Avalia na Concessão da Guarda?

Quando um pai (ou mãe) pleiteia a guarda do filho e não possui casa própria, o juiz e as equipes técnicas (psicólogos e assistentes sociais) responsáveis pelo caso vão investigar uma série de elementos para determinar o que é, de fato, o melhor para a criança. Alguns dos fatores mais relevantes incluem:

 

1. Ambiente Adequado e Estabilidade

É fundamental demonstrar que o pai pode oferecer um ambiente seguro e estável. Isso engloba:

  • Condições de Moradia: O imóvel (seja alugado, cedido ou próprio) é adequado em termos de higiene, segurança, espaço suficiente para a criança ter um quarto (ou um espaço próprio), e acesso a serviços básicos (água, luz, saneamento)?
  • Rotina: A rotina do pai permite que ele esteja presente e que ofereça estabilidade nos horários de escola, alimentação, sono e lazer?
  • Rede de Apoio: Existem outros adultos (avós, tios, madrastas/padrastos) que podem auxiliar nos cuidados com a criança?

 

2. Capacidade Financeira e de Sustento

A capacidade de sustentar o filho é um ponto crucial. O juiz vai analisar se o pai tem condições financeiras de prover as necessidades básicas da criança, como alimentação, vestuário, saúde, educação e lazer. Isso não significa ser rico, mas ter uma renda compatível com as despesas do filho. A comprovação de uma renda estável (mesmo que seja por trabalho informal ou autônomo, desde que demonstrada) é mais importante do que a posse de bens.

 

3. Vínculo Afetivo e Capacidade Parental

Este é, sem dúvida, um dos pilares da decisão. O juiz buscará identificar:

  • Vínculo Afetivo: Qual a qualidade do relacionamento do pai com o filho? Existe afeto, carinho e respeito mútuo?
  • Participação na Vida do Filho: O pai já participa ativamente da vida escolar, médica e social do filho? Ele demonstra interesse genuíno nas atividades e no desenvolvimento da criança?
  • Capacidade de Atendimento às Necessidades: O pai consegue identificar e atender às necessidades específicas do filho, sejam elas emocionais, educacionais ou de saúde?

 

4. Conduta Moral e Psicológica

A conduta moral do pai, seu histórico (criminal, de violência, de uso de substâncias), e sua estabilidade psicológica são fatores de peso. O foco é garantir que a criança esteja em um ambiente livre de riscos e que o pai tem condições de oferecer um suporte emocional saudável.

 

5. Opinião da Criança/Adolescente (Conforme a Idade)

Se o filho tiver idade e discernimento suficientes (geralmente a partir dos 10-12 anos, mas pode variar), sua opinião será ouvida e considerada pelo juiz, respeitando-se o princípio do seu direito de ser ouvido.

 

6. Relatório Social e Psicológico

Em muitos casos de disputa de guarda, o juiz solicita estudos psicossociais. Assistentes sociais e psicólogos visitam os lares de ambos os pais, entrevistam a criança e os envolvidos, e produzem relatórios detalhados. Esses relatórios são cruciais, pois oferecem uma visão técnica e imparcial sobre qual ambiente seria mais benéfico para o menor. A ausência de casa própria será observada, claro, mas apenas como um dos múltiplos fatores.

 

Cenários Comuns e Como Agir

 

Cenário 1: Pai Vive de Aluguel ou em Imóvel Cedido

Se o pai vive de aluguel ou em um imóvel cedido (como na casa dos pais, por exemplo), isso não é, por si só, um impeditivo. A questão é: o aluguel está em dia? O contrato é estável? O ambiente é seguro e oferece espaço adequado? No caso de imóvel cedido, as pessoas que dividem o espaço são adequadas? Há privacidade e estrutura para a criança?

Como agir: Apresentar o contrato de aluguel (comprovando regularidade), fotos do ambiente interno do imóvel, e demonstrar que, mesmo não sendo proprietário, há estabilidade e boas condições de moradia.

 

Cenário 2: Pai Recentemente Mudou-se ou Está em Processo de Mudança

A instabilidade pode ser um ponto negativo. Se o pai está em uma fase de muitas mudanças, o juiz pode entender que isso não é o ideal para a criança naquele momento. No entanto, se as mudanças são para melhor e fazem parte de um planejamento sólido (por exemplo, mudando para uma casa maior para acomodar o filho), isso pode ser visto positivamente.

Como agir: Apresentar um planejamento claro, talvez até com o contrato do novo aluguel ou termo de cessão, mostrando que a mudança visa o bem-estar do filho e trará mais estabilidade.

 

O Papel do Advogado Especialista em Direito de Família

Diante de um processo de guarda, a presença de um advogado especialista em Direito de Família é indispensável. Ele será seu maior aliado para:

  1. Avaliar a Situação: Analisar as particularidades do seu caso e as chances de sucesso.
  2. Preparar a Documentação: Orientar sobre todos os documentos e provas necessárias (financeiros, de moradia, escolares da criança, etc.).
  3. Construir a Argumentação Jurídica: Apresentar ao juiz os motivos pelos quais a guarda deve ser concedida a você, focando sempre no melhor interesse da criança e desmistificando a ideia de que a falta de casa própria é um impeditivo.
  4. Negociar: Tentar uma solução amigável com a ex-companheira, buscando um acordo de guarda compartilhada ou unilateral que beneficie o filho.
  5. Representação Legal: Defender seus interesses no processo judicial, impugnando as alegações da outra parte e garantindo que seus direitos sejam respeitados.

Um bom advogado saberá destacar todos os pontos positivos da sua capacidade parental e das condições que você oferece, minimizando o impacto de não ter um imóvel próprio.

 

A Importância da Estabilidade e do Afeto

Em suma, a resposta para a pergunta “Pai quer a guarda do filho, mas não tem casa própria: isso impede?” é um categórico NÃO. A ausência de propriedade de um imóvel, por si só, não é um fator impeditivo para que um pai obtenha a guarda do filho. O que a Justiça realmente busca é a estabilidade emocional, material e a capacidade de oferecer um ambiente seguro e amoroso para o desenvolvimento pleno da criança.

Se você é pai e almeja a guarda de seu filho, não deixe que esse mito o desanime. Concentre-se em demonstrar sua capacidade de prover afeto, cuidado, estabilidade e condições adequadas de vida, independentemente de ser em um imóvel próprio ou alugado. Busque o apoio de um advogado especializado em Direito de Família. Com a orientação correta e uma argumentação sólida, seus direitos e, principalmente, o bem-estar de seu filho, estarão protegidos.

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