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Ausência no home office: como a empresa deve comprovar?

Advogado especialista em direito trabalhista revisando um contrato de teletrabalho (home office), simbolizando a comprovação legal da ausência do funcionário.

O regime de home office, ou teletrabalho, consolidou-se como uma realidade irreversível no mundo corporativo. Se por um lado trouxe flexibilidade e redução de custos, por outro, gerou um dos maiores desafios para a gestão de pessoas e para o departamento jurídico: como gerenciar a ausência no home office?

Quando o funcionário estava na sede da empresa, a ausência era física, visível e de fácil constatação. No ambiente virtual, contudo, a ausência é etérea. O empregado está online mas não responde? Ele “sumiu” das ferramentas de chat? Ele deixou de entregar uma demanda no prazo? A linha entre uma pausa para o café e o abandono do posto de trabalho tornou-se perigosamente tênue.

O cerne da questão não é apenas a queda de produtividade. A comprovação dessa ausência é o pilar para a aplicação de medidas disciplinares, como advertências, suspensões e, em casos extremos, a demissão por justa causa. Fazer isso de forma equivocada expõe a empresa a riscos jurídicos graves, incluindo ações de danos morais.

Este artigo aborda, sob a ótica jurídica e prática, como a empresa deve proceder para comprovar a ausência no teletrabalho de forma segura e em conformidade com a legislação.

 

Desenvolvimento: Navegando entre o Poder Diretivo e o Direito à Privacidade

Para comprovar uma falta no regime de home office, a empresa precisa, antes de tudo, ter estruturado corretamente o seu regime de teletrabalho. O método de comprovação depende diretamente do que foi acordado em contrato.

 

1. O Ponto de Partida: O que Diz o Contrato de Teletrabalho?

A legislação trabalhista (CLT), especialmente após as recentes reformas (Lei 14.442/2022), exige que o teletrabalho conste expressamente do contrato individual de trabalho ou de um aditivo contratual. É neste documento que a “regra do jogo” é definida.

A CLT, em seu Artigo 75-B, permite duas modalidades principais de teletrabalho:

  1. Contratação por Tarefa (ou Produção): Neste modelo, o empregado não está sujeito ao controle de jornada. Ele é pago pelas entregas, não pelas horas à disposição.
  2. Contratação por Jornada (Horário Fixo): Neste modelo, o empregado, mesmo em casa, deve cumprir um horário de trabalho específico (ex: das 9h às 18h) e está sujeito ao controle de jornada.

Essa distinção é crucial. Se o contrato for por tarefa, o conceito de “ausência” muda. O empregado não está “ausente” se sumir às 14h; ele estará inadimplente se não entregar a tarefa no prazo estipulado. A comprovação da falta, nesse caso, é o próprio descumprimento do prazo de entrega.

Contudo, se o contrato for por jornada, o empregado tem o dever de estar à disposição do empregador durante aquele período. A ausência, aqui, é a indisponibilidade durante o horário contratual. É neste cenário que a comprovação se torna complexa.

 

2. O Ônus da Prova: A Empresa Deve Comprovar a Falta

No Direito do Trabalho, vige o princípio de que o ônus de provar a falta grave do empregado (como a desídia ou o abandono de emprego) é integralmente do empregador.

Não basta a “sensação” de que o funcionário não está trabalhando. A empresa precisa de provas robustas, objetivas e, o mais importante, obtidas por meios lícitos. Tentar comprovar uma ausência utilizando métodos invasivos é o caminho mais curto para reverter uma justa causa e gerar uma indenização por danos morais.

 

3. Métodos Lícitos de Comprovação de Ausência (Controle de Jornada)

Se o contrato prevê controle de jornada, a empresa pode (e deve) usar ferramentas tecnológicas para verificar a disponibilidade. Os meios lícitos mais comuns são:

É importante frisar: uma única mensagem não respondida não prova ausência. A empresa deve demonstrar a reiteração e a falta de justificativa para essa indisponibilidade.

 

4. Métodos Ilícitos ou de Alto Risco: A Violação da Privacidade

Na ânsia de monitorar, muitas empresas ultrapassam o limite do bom senso e da legalidade. O direito à privacidade do empregado (Art. 5º, X, da Constituição Federal) se estende à sua casa.

São considerados meios ilícitos ou de altíssimo risco:

Usar provas obtidas por esses meios é, juridicamente, um tiro no pé. Elas são consideradas provas ilícitas e serão desconsideradas no processo, além de fundamentarem um pedido de indenização contra a empresa.

 

5. O Caso Extremo: O Abandono de Emprego no Home Office

A “ausência” pode evoluir para algo mais grave: o abandono de emprego, que é uma das hipóteses de justa causa (Art. 482, ‘i’, CLT).

Para configurá-lo, a Justiça do Trabalho exige dois elementos:

  1. O elemento objetivo: A ausência prolongada (a jurisprudência consolidou o prazo de 30 dias consecutivos de falta).
  2. O elemento subjetivo: A intenção do empregado de não retornar (animus abandonandi).

No home office, provar isso é um desafio. Se o empregado simplesmente “sumir” (não logar, não responder e-mails, não entregar nada), a empresa deve tomar as seguintes providências formais:

  1. Documentar todas as tentativas de contato: Salvar e-mails, mensagens de Teams/Slack, registros de ligações.
  2. Enviar Notificação Formal: Após alguns dias de ausência total, a empresa deve enviar uma notificação extrajudicial (preferencialmente por telegrama com cópia e aviso de recebimento) ao endereço físico cadastrado do empregado.
  3. Conteúdo da Notificação: O texto deve convocar o empregado a retomar suas atividades (virtuais) ou a justificar suas faltas em um prazo determinado (ex: 48 horas), sob pena de caracterização de abandono de emprego.

Se o empregado não responder à notificação e o prazo de 30 dias se completar, a empresa terá os elementos objetivo (30 dias) e subjetivo (intenção de não responder, presumida pela notificação ignorada) para aplicar a justa causa.

Prevenção Contratual é a Melhor Estratégia

O home office não é um “território sem lei”. O poder diretivo do empregador continua existindo, mas deve ser exercido com maior inteligência e respeito aos limites da privacidade.

A comprovação da ausência no teletrabalho é perfeitamente possível, desde que realizada por meios técnicos, objetivos e não invasivos. A chave para isso não está na vigilância agressiva, mas na prevenção jurídica.

A maior vulnerabilidade das empresas hoje é a ausência de um contrato de teletrabalho robusto e claro. Sem definir contratualmente se o regime é por jornada ou tarefa, quais são os canais oficiais de comunicação e quais os softwares de controle (como o ponto eletrônico), a empresa fica de mãos atadas, incapaz de provar a falta e de aplicar a sanção. O custo de uma política de home office mal redigida é, invariavelmente, pago na Justiça do Trabalho.

Se sua empresa adota o modelo híbrido ou de home office e seus contratos são omissos ou genéricos quanto ao controle de jornada e produtividade, seu negócio está exposto.

Nosso escritório é especializado em Direito Trabalhista Empresarial e focado na consultoria preventiva. Estamos preparados para revisar ou redigir sua política de teletrabalho, seus contratos e aditivos, garantindo que sua empresa tenha segurança jurídica para gerir suas equipes remotas.

Convidamos você a entrar em contato conosco. Agende uma consulta para esclarecer suas dúvidas, solicitar uma análise de risco dos seus documentos atuais ou um orçamento para a blindagem jurídica do seu RH.

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