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O marketplace apagou minha reclamação. Isso pode?

Reclamação no Marketplace

É uma cena comum nos dias de hoje: você faz uma compra em um marketplace — seja para adquirir um produto, contratar um serviço ou até vender algo — e, em algum momento, surge um problema. Seja um produto com defeito, uma entrega que não chegou, um serviço mal prestado ou uma divergência com o vendedor. A primeira atitude, geralmente, é utilizar o sistema de reclamação ou mediação oferecido pela própria plataforma. No entanto, para a surpresa e frustração de muitos, a reclamação simplesmente desaparece, é apagada ou excluída sem uma explicação clara.

Se você passou por isso, é natural se perguntar: “O marketplace apagou minha reclamação, isso pode?” A resposta para essa pergunta envolve a complexa relação entre as regras das plataformas digitais e os direitos do consumidor garantidos pela legislação brasileira. E a exclusão arbitrária de uma reclamação legítima está longe de ser uma prática inócua ou legal em muitos casos.

Este artigo visa esclarecer seus direitos nesse cenário, explicar por que essa prática pode ser considerada abusiva e ilegal sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor (CDC), e mostrar o que você pode fazer para garantir que sua reclamação seja ouvida e seus direitos sejam respeitados.

O Papel do Marketplace na Relação de Consumo

Para entender se o marketplace pode ou não apagar sua reclamação, primeiro precisamos situar o papel dessa plataforma. O marketplace atua como um intermediário, um facilitador que conecta vendedores (muitas vezes chamados de “lojas parceiras”, “sellers” ou “fornecedores”) a compradores (os consumidores).

Embora não sejam os vendedores diretos dos produtos ou serviços na maioria das transações, os marketplaces são prestadores de serviço tanto para os vendedores (oferecendo a plataforma para vendas, ferramentas, etc.) quanto para os consumidores (oferecendo um ambiente de compra, sistemas de pagamento, e, crucialmente, canais de comunicação e reclamação).

Portanto, na relação entre o consumidor e o marketplace (como prestador de serviço da plataforma) e entre o consumidor e o vendedor (que usa a plataforma), aplicam-se as normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC). E o CDC estabelece princípios e direitos inegociáveis para o consumidor.

A Reclamação Como Ferramenta Essencial na Relação de Consumo

O sistema de reclamação e mediação oferecido pelos marketplaces é uma ferramenta fundamental. Ele serve não apenas para tentar resolver o problema diretamente entre comprador e vendedor com a ajuda da plataforma, mas também como um registro, uma prova formal da tentativa do consumidor de solucionar a questão.

Esse registro da reclamação é uma forma de o consumidor exercer seu direito à informação e à resolução de conflitos. Ele documenta a data da reclamação, o problema relatado, as tentativas de contato e a posição das partes. Essa prova é vital, especialmente se a questão não for resolvida amigavelmente e o consumidor precisar buscar outras vias de solução, como órgãos de defesa do consumidor (Procon, Consumidor.gov.br) ou o Poder Judiciário.

O Marketplace Pode Apagar Minha Reclamação? A Visão do Direito do Consumidor

Aqui chegamos ao ponto central. Os marketplaces possuem Termos de Uso e políticas de privacidade que regulam a relação entre a plataforma e seus usuários. Esses termos geralmente incluem regras sobre a utilização dos canais de comunicação e reclamação, e podem prever a moderação ou remoção de conteúdo que viole suas políticas (como mensagens ofensivas, spam, conteúdo ilegal, etc.).

Contudo, os Termos de Uso de uma plataforma online, por mais detalhados que sejam, não podem se sobrepor à legislação brasileira, especialmente ao Código de Defesa do Consumidor, quando a relação envolvida é de consumo. O CDC é uma lei de ordem pública e interesse social, e suas normas são cogentes, ou seja, de aplicação obrigatória.

O CDC protege o consumidor contra cláusulas abusivas (Art. 51) que o coloquem em desvantagem exagerada ou que sejam incompatíveis com a boa-fé e a equidade. Nesse cenário, a exclusão ou apagamento de uma reclamação legítima, feita de boa-fé pelo consumidor para relatar um problema relacionado a uma transação na plataforma, pode ser considerada uma prática abusiva.

Por quê?

  1. Violação do Direito à Informação e Transparência: Apagar o registro da reclamação impede que o consumidor tenha acesso ao histórico completo de sua interação e da sua tentativa de resolução, violando seu direito à informação e à transparência na relação de consumo (Art. 6º, III do CDC).
  2. Remoção de Prova: A reclamação é uma prova da existência de um problema e da tentativa de solução. Ao removê-la, o marketplace dificulta ou impossibilita que o consumidor utilize esse registro em outras instâncias de resolução de conflitos (Procon, Justiça). Isso coloca o consumidor em uma posição de extrema desvantagem.
  3. Favorecimento Indevido: A exclusão da reclamação pode ser vista como uma forma de favorecer o vendedor, “limpando” o histórico de problemas e prejudicando a avaliação que outros consumidores possam fazer sobre aquele vendedor ou produto.
  4. Prática em Desacordo com a Boa-Fé: Uma plataforma que se propõe a ser um ambiente seguro para transações deve agir com boa-fé e lealdade, o que inclui gerenciar os conflitos de forma transparente, e não ocultá-los ou apagar seus registros.

Portanto, um marketplace não pode simplesmente apagar uma reclamação feita de forma legítima por um consumidor sobre um problema em uma transação, a menos que essa reclamação caia em categorias claramente abusivas (como spam excessivo, linguagem ofensiva, conteúdo ilegal, etc. – e mesmo nesses casos, a plataforma deve ter regras claras e justificativas para a remoção). A simples alegação de que a reclamação não procede não justifica sua exclusão do sistema de registro.

Quando a Remoção Pode Ser Justificada (e Quando Não)

Para deixar mais claro, vejamos alguns exemplos:

O Que Fazer Se Sua Reclamação Foi Apagada?

Se você teve uma reclamação legítima apagada em um marketplace, não se desespere e não se sinta impotente. Há passos que você pode e deve seguir:

  1. Documente Tudo (Tire Prints!): Essa é a regra de ouro no Direito do Consumidor online. Antes mesmo que a reclamação suma, ou logo que perceber que sumiu, documente. Tire prints da tela da reclamação (se ainda estiver visível), das mensagens trocadas, do produto/serviço adquirido, do anúncio, do comprovante de pagamento, do rastreamento. Se a reclamação já sumiu, tire prints da área onde ela deveria estar, mostrando sua ausência. Registre datas e horários.
  2. Contate Novamente o Marketplace: Use outros canais de atendimento da plataforma (e-mail, chat, telefone, redes sociais) para questionar a exclusão da reclamação e exigir que ela seja reativada ou que lhe seja fornecido um registro completo do histórico daquela interação.
  3. Busque os Órgãos de Defesa do Consumidor: Se o marketplace não resolver ou não justificar adequadamente a exclusão, formalize sua reclamação em plataformas como o Consumidor.gov.br (que muitas empresas de e-commerce respondem) e o Procon da sua cidade/estado. Esses órgãos atuam na mediação e fiscalização das relações de consumo.
  4. Considere a Via Judicial: Se mesmo após essas tentativas o problema persistir, e especialmente se a exclusão da reclamação causou a você algum prejuízo (material, como a perda do valor pago, ou moral, pela frustração, perda de tempo e sensação de impotência), pode ser o momento de buscar a Justiça.

A Importância da Prova e do Advogado do Consumidor

Em qualquer litígio, a prova é fundamental. Ter documentado a existência da reclamação (antes de ser apagada) e a própria exclusão (prints mostrando que ela não está mais lá) é sua principal ferramenta.

Nesse ponto, a atuação de um advogado especialista em Direito do Consumidor é essencial. Ele saberá interpretar a situação à luz da legislação, identificar as infrações cometidas pelo marketplace (como a violação do direito à informação, prática abusiva), reunir e organizar as provas, e ingressar com a medida judicial cabível (seja no Juizado Especial Cível para causas de menor valor ou na Justiça Comum), buscando a reparação dos seus direitos e eventuais danos sofridos (materiais e/ou danos morais).

O advogado poderá argumentar que a exclusão da reclamação configura uma violação à boa-fé objetiva e aos princípios do CDC, buscando, por exemplo, a obrigação de a plataforma reativar a reclamação ou o reconhecimento judicial do problema original e dos prejuízos decorrentes da conduta do marketplace.

Seus Direitos Valem Online Também!

A conveniência dos marketplaces revolucionou a forma como compramos e vendemos. Contudo, essa inovação não pode servir de escudo para práticas que violem os direitos básicos do consumidor. A exclusão arbitrária de uma reclamação legítima é uma prática questionável, potencialmente ilegal e que mina a confiança na plataforma.

Lembre-se: sua reclamação é um registro, uma prova e o exercício do seu direito de buscar a solução para um problema na relação de consumo. Apagar esse registro é, muitas vezes, uma forma de tentar apagar o problema e dificultar a vida do consumidor.

Não aceite ter seus direitos apagados junto com sua reclamação. Documente, reclame nos canais adequados (inclusive Procon e Consumidor.gov.br) e, se necessário, busque o apoio de um advogado especialista em Direito do Consumidor para garantir que sua voz seja ouvida e seus direitos sejam respeitados, mesmo que seja preciso ir à Justiça. Seus direitos valem tanto no mundo físico quanto no digital.

Teve sua reclamação apagada em um marketplace e não sabe o que fazer?

Não se sinta desamparado. Nossa equipe de advogados especialistas em Direito do Consumidor está pronta para analisar seu caso, orientar sobre os próximos passos e buscar a defesa dos seus direitos. Entre em contato e agende uma consulta.

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